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A continuidade da crise política brasileira, a polarização da sociedade, a fragmentação partidária, a persistência dos problemas econômicos e o radicalismo do presidente Jair Bolsonaro contribuíram para uma piora da democracia no Brasil.
A constatação está no Índice de Transformação Bertelsmann (BTI). Esse estudo, publicado a cada dois anos, avalia a consolidação da democracia e da economia de mercado nos países em desenvolvimento.
Os autores apontam o Brasil, ao lado da Hungria e da Índia, como um exemplo negativo de democracia outrora estável que vem sucumbindo ao desmantelamento do Estado de direito e das liberdades civis.
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“Exemplos disso são o nacionalismo hindu na Índia, o populismo de direita no Brasil ou o curso autoritário da Hungria, membro da União Europeia. Os desenvolvimentos nesses países são representativos da crescente polarização política que também está abalando as democracias consolidadas”, destacam os autores.
Segundo o ranking divulgado nesta quarta-feira (29) pela Fundação Bertelsmann, da Alemanha, a nota consolidada do Brasil no índice – que vai de 0 a 10 – retrocedeu de 7,3 para 7,2 entre 2018 e 2020. É a pior nota já concedida ao país desde o início da série, em 2006.
Em 2014, quando a crise econômica e política ainda não havia afetado tanto o país, a nota consolidada chegou a 8,0.
Desde então, outros fatores, como o impeachment de Dilma Rousseff, a instabilidade do governo Michel Temer, a decadência econômica e a crescente desconfiança da população brasileira com o sistema democrático já haviam levado o Brasil a perder pontos em 2018.
Democracia no Brasil pior que a da Argentina
No ranking mais recente, o Brasil acabou ultrapassado por países como Jamaica e Argentina e ficou empatado com Montenegro e a Macedônia do Norte. A queda só não foi maior porque outros países que estavam antes à frente do Brasil, como a Hungria, retrocederam ainda mais; e outras nações passaram a ser analisadas.
A lista de 2020 inclui 137 países. A piora levou o Brasil a cair da 22ª posição para 23ª no ranking geral. Quando analisada apenas a saúde democrática do país, a nota concedida ao Brasil decresceu de 7,7 em 2018 para 7,4.
Em comparação com outros países da América Latina, nesse quesito, o Brasil aparece bem atrás de nações como Argentina (nota 8,2) e Uruguai (9,9). Em 2014, o indicador brasileiro de democracia alcançou sua nota mais alta no índice BTI: 8,2, ocupando a 17° posição. Desde então, só decresceu.
A análise da situação brasileira não cobriu boa parte do primeiro ano do governo Bolsonaro. O texto, por exemplo, deixa de fora marcos da administração, como a aprovação da reforma da Previdência, a queda de vários ministros, os seguidos choques com o Congresso e com o Judiciário, o crescente isolamento internacional do país e as intermináveis crises no interior do governo, além das ofensivas do governo contra adversários.
Algumas expectativas, como a de que o pais fosse voltar a um caminho sustentável de crescimento econômico, acabaram sendo atropeladas pela pandemia de covid-19 e a dificuldade do governo em propor e implementar reformas.

Preocupação com tendências autoritárias do presidente
O relatório ainda apontava que a nomeação de Sergio Moro para o Ministério da Justiça em 2018 sinalizava que a questão do combate da corrupção seria importante para o governo. Alguns trechos também envelheceram.
“Ainda é muito cedo para julgar até que ponto Bolsonaro, como presidente, continuará promovendo divisões na sociedade brasileira”, destacaram os autores, sinalizando que a análise só levou em conta as primeiras semanas do governo em 2019.
“Se levarmos em conta a retórica do novo presidente Bolsonaro a sério, não há mais consenso sobre democracia como objetivo estratégico e de longo prazo no Brasil”
Ainda assim, os autores expressam preocupação com as tendências autoritárias que o presidente demonstrava no início do ano passado. “Mesmo que apenas uma parte das medidas sociopolíticas anunciadas por Bolsonaro sejam implementadas, a agenda política do Brasil se tornará cada vez mais iliberal”, destacam.
“O presidente de direita Jair Bolsonaro, que está no cargo desde janeiro de 2019, pressionou a polarização através de sua retórica excessiva contra a ‘esquerda’, mulheres, grupos LGBT e indígenas e afro-brasileiros. A eleição de Bolsonaro foi resultado da polarização social e, ao mesmo tempo, a alimentou.”
“Se levarmos em conta a retórica do novo presidente Bolsonaro a sério, não há mais consenso sobre democracia como objetivo estratégico e de longo prazo no Brasil. Bolsonaro falou a favor da tortura, glorificou nostalgicamente a ditadura militar brasileira (1964-1985) e causou indignação repetidamente com comentários iliberais, racistas, anti-mulheres e anti-gays”, aponta o texto.
Confira a íntegra do artigo e veja outros apontamos do estudo.